Jayme e os dez mil poetas

Jayme abriu os olhos mansamente,
Num silêncio de poço...
Sentou, fechou um palheiro,
Olhou para os lados mas não viu ninguém...

Jayme estava só à beira do fogo,
Um fogo grande de incendiar invernos,
Desses que vivem no olhar das prendas
E que consomem tantos corações.

Já não sabia onde estava
Mas era noite de frio...
E os olhos claros de Jayme
Singraram pelo vazio.

Talvez perdidos nos braços
De alguma paixão extrema...
Talvez voando sem asas
No céu de mais um poema.

Jayme estava em silêncio
E em silêncio ficou...
Puxou um naco de fumo
E lentamente picou.

De repente dez mil luzes,
Dez mil sóis, dez mil estrelas
Se puseram a brilhar...
Dez mil lendas andarilhas,
Dez mil almas em vigília
Se achegaram ao lugar.

Dez mil pássaros surgiram
E dez mil anjos caíram
por entre os focos de luz...
Dez mil vates e profetas,
Dez mil sonhos, dez mil poetas
Dez mil mártires sem cruz.

Jayme sentiu tempestades
Trovoando no coração...
Os poetas foram chegando
Sem nunca tocar o chão.
Jayme ouviu as palavras
Desses dez mil querubins;
Num mnesmo tom de verdade
Então disseram assim:

"- Teus versos vem das entranhas,
Não só da terra vermelha,
Mas da própria humanidade
Onde teu sonho se espelha."

"Quando criavas tuas rimas,
Quando soltavas tua voz...
Em cada luz que parias
Havia um pouco de nós."

"Somos o sonho construído pelas eras,
Em cada estrofe que alguém ousou compor...
Pois na verdade ninguém cria, é instrumento
Que o pensamento dos antigos dominou."

"Tens o teu Dom porque és um ser iluminado,
Foste escolhido pra seguir essa odisséia...
Onde as nações sangram as chagas do pecado,
E o poeta traz a cura com as idéias."

"Somos a fé em tudo aquilo que buscavas,
Dez mil guerreiros construindo um ideal...
Somos a vida florescida nas palavras
Somos a chama da poesia universal."

"Estás aqui, companheiro,
Pois tens razões para estar...
E hoje vieste tomar
Um lugar perto dos teus;
Estás aqui, missioneiro
Porque és irmão e parceiro...
E o teu solo vermelho
É o próprio sangue de Deus."

Jayme engoliu o silêncio
E uma lágrima caiu...
Numa força mais intensa
Que as águas de um grande rio.

Os anjos então partiram,
Riscando o céu num clarão...
Foi quando o mais nobre arcanjo
Levou Jayme pela mão.

E hoje quando um poeta
Nalgum confim do planeta
Se veste de coração,
Existem dez mil guerreiros
Mais um anjo missioneiro
Voando sem cativeiros,
Ocultos na inspiração!!!

Nenhum comentário:

Postar um comentário